BlogBlogs.Com.Br

quinta-feira, 30 de abril de 2009

A sagrada miséria





Ainda era cedo quando acordei pra estudar. Os primeiros raios de sol raiavam timidamente pela janela e incidiam severamente sobre o livro de direito tributário. Eram as primeiras ordens do dia para o estudo. Passar não era opção. Estudar, menos ainda.

Do outro lado da rua estava Carlão. Lata de cerveja na mão, cigarro nervosamente tragado um atrás do outro. Aguardava o horário que supunha que eu acordaria para lamentar as suas misérias. Nem todos querem ouvir nossas misérias, menos ainda suportá-las. Mas eu era tudo que ele tinha.

- Porra, 8 da manhã, ele já deve ter acordado. - Pensou Carlão rumando em direção ao meu apartamento.
- Ô RAPAZ....ACOOOORDA. - Exclamava Carlão, no topo de sua sutileza.
- Já tô acordado, meu velho, entra aí, mas fala rápido, tô estudando.
- Cara, fudeu! Vou ser demitido.
- Porra Carlão, como assim?
- Fiquei sabendo, preciso conversar. - Jamais admitiria precisar de apoio, isso era o mais próximo que ele podia chegar.
- Tá, vamos lá, mas é rápido, preciso voltar pros estudos.

Saímos em direção ao primeiro bar, onde Carlão puxou uma cadeira pra ele e outra pra mim.
- Senta aí que eu te explico.
- Velho, você sabe que eu não vou beber, preciso passar nesse concurso.
- Você vai passar, tudo que tem feito é estudar. - Exclamou Carlão, numa segurança que só temos quando o problema não é nosso. Ah, como é fácil lidar com a miséria alheia.
- Um monte de pessoas só faz estudar há anos meu velho, não é tão certo assim que eu vou passar.
- Posso falar do meu problema?
- Claro, claro, desculpa.
- Então. Vou ser despedido.
- Mas há quantos anos você está na empresa? - Perguntei, com a mesma segurança que temos quando o problema não é nosso.
- 2 anos. Mas não é esse o caso. Tenho problema de coluna. Vou entrar com atestado médico, pedir licença, quando eu sair da licença recebo meus direitos, meus benefícios.
- Caralho, Carlão, mas isso é fraude.
- Fraude o que, porra? Eu pago INSS todo ano, essa merda não é pra me valer de alguma coisa?
Nesse momento, entra um mendigo. Os pés coalhados de feridas. As mãos trêmulas. Um olhar confuso, pupilas dilatadas ao extremo, talvez pelo medo, talvez pelo abuso de drogas, mais provavelmente pelos dois, um em decorrência do outro independentemente da ordem. Apesar do olhar expressar experiência, aparentava não mais que dezoito anos.
- Dá um trocado, tio? - Pediu voltado pra Carlão, com súbito olhar choroso em troca do olhar confuso, porém mantendo as pupilas dilatadas e o tremos nas mãos.
- Toma aí, meu bom. - Disse Carlão, estendendo uma nota de dois reais. O moleque se distanciou.
- Caralho, Carlão, não tá vendo que ele é um viciado?
- E será que ele não tem motivo pra ser? O cara tá na merda, deixa ele pedir pra não morrer de fome.
- Fome? Ele vai é fumar crack. Aquele menino que ronda lá na rua sim. Não tem uma perna, tem três filhos. Há quem diga que ele fuma crack, mas quando pede dinheiro...a ele eu dou.
- E esse você acha que não come?
- Bom, esquece essa porra, e adianta o assunto, preciso estudar.
- Meu velho, eu vou me encostar pelo INSS, preciso da grana.
- Precisa da grana pra que, Carlão? Pagar seu carro, pagar sua cerveja? Isso é fraude do fisco, porra. Se ao menos você não pudesse trabalhar, não pudesse se mexer, sei lá.
- Tá, tá!! Você tá muito enfiado nesses estudos seus. Meu primo também tá estudando pra essa merda e não tá assim, ficando louco.
- É, deve ser porque ele tem emprego em um turno, tem renda e não tem filho. Fora que ele tem a esposa pra ajudar ele. Porra Carlão, vê se me entende. - Dito isso, me levantei. Na hora da raiva nem pensei nos problema do Carlão, tava muito puto. Precisava estudar mais três horas de tributário pra começar a estudar as mudanças de lei. O Carlão virou pro outro lado e me mandou tomar no cú. Notei a falta de ânimo da assertiva, logo essa frase que el falava com tanto orgulho "Vá tomar no cú". O orgulho dele impediu de demosntrar tristeza e o meu de demonstrar que me importava.

Andando pela rua, até chegar ao apartamento, escutei duas mulheres conversando:

- Pois é, minha filha ela encontrou ele na cama com outra.
- Mais bonita que ela?
- Muito mais.
- E foi por amor?
- Com certeza. Ele ainda colocou ela pra fora de casa e deitou a outra na cama na mesma hora.
- Mas eles tinham filhos?
- Graças a Deus não.
- Pois bem, minha filha. Pena eu sinto é da minha comadre que foi igualzinha a essa daí, mas foi posta pra fora foi junto com os três filhos.

Abri a porta do prédio com aquelas palavras na mente. Então pensei:Como é difícil ser miserável o suficiente para que mereçamos compaixão. É preciso que nos esmeremos muito em ser miseráveis e que sejamos supinamente derrotados, caso contrário, assim como num concurso tomam a nossa vaga.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Pequena cena


A princípio, gostaria de pedir desculpas pela enorme demora entre uma postagem e outra. Isso se deu por minha vida estar passando por muitas loucuras. Também, pelo fato de que estou de férias. Nesse início de férias me dediquei a meus projetos pessoais e, apesar do blog ser um deles, acabei por deixar o blog meio de lado. Além disso, nas férias sempre ficamos meio lentos, né?

Enfim, resolvi agora postar uma pequena cena que me veio à cabeça, influenciado por diversas leituras de férias.  Lá vai.



Soluções


Senhor de meia idade: (demonstrando certo desconforto por estar alí) Boa tarde, gostaria de uma solução pra a minha vida.

Atendente: Senhor, não sei se ficou claro para o senhor, mas isso daqui é prostíbulo.

Senhor de meia idade: Sim, justamente. É que meu problema é de cunho sexual e não achei que deveria falar com um psicanalista.

Atendente: Mas senhor, não é justamente de problemas de cunho sexual que os psicanalistas mais tratam?

Senhor de meia idade: Bom, deixe-me apresentar. Meu nome é Stan e eu sou justamente um psicanalista. Tenho medo de buscar outro psicanalista. de repente eu viraria uma piada interna, sabe? Essa conversa de ética profissional é balela pura.

Atendente: Espera um pouco, quer dizer que em rodas de poker, em bate-papo de bar, vocês falam de seus pacientes?

Stan: Certamente.

Atedente: Então muitos de vocês devem saber que eu sou filha de família rica e trabalho em prostíbulo por não me sentir aceita pela minha família e preferir ser vista com putas a ser vista com os meus pais?

Stan: Sarah? Sarah, paciente do Claus, não é isso?

Sarah: Puta que pariu. Qual é o problema de vocês?

Stan: O deles eu não sei, mas o meu é que não consigo ter uma ereção com mulher alguma. Tenho a impressão de que já tive todas.

Sarah: Mas o senhor já teve muitas?

Stan: São todas parecidas, isso facilita o meu problema.

(Entra um homem de uns 28 anos, aprentemente bêbado)

Rapaz: Sarah, tem alguma puta nova hoje?

Sarah: Claro que sim, Carlão, aguarde um minuto que a chamarei.

Stan: (para Sarah) Ah, a juventude. Ele certamente não tem o meu problema.

Sarah: Pelo contrário, talvez ele tenha a sua cura. Porque não fala com ele?

Stan: (parecendo confuso) Acha que ele poderá me ajudar?

Sarah: Está aqui todo dia, sempre em busca de novas moças, talvez te ajude sim.

Stan: (Aproximando-se do rapaz) Boa tarde, meu jovem.

Carlão: (Gritando com Sarah) Porra, Sarah, quantas vezes preciso repetir que não sou viado. E esse ainda é careca, que decadência, ein?

Stan: Não, não. Deixe-me explicar. Eu sou um psicanalista que aparentemente enjoei das mulheres.

Carlão: Cara, você não entendeu quando eu disse que não sou viado?

Stan: Não é isso. A Sarah me disse que talvez pudesse me ajudar, já que você vem aqui todos os dias em busca de novas mulheres e parece jamais enjoar delas.

Carlão: Ok, meu velho. Enquanto a puta não vem, vamos brincar de psicólogo.
Pra começar, porque você acha que enjoou das mulheres?

Stan: Sinto como se já tivesse tido todas.

Carlão: E teve?

Stan: Algumas delas, mas são muito parecidas.

Carlão: Ok ok.  Vamos do princípio. Porque você come uma mulher?

Stan: Porque eu preciso de sexo?

Carlão: (em um pulo, como quem acabou de achar o problema) AHÁ! Aí está o primeiro erro.

Stan: E porque eu deveria comer uma mulher então?

Carlão: Porque você é homem. Isso é o que fazemos, mesmo que não precisemos.

Stan: Então eu devo fazer sexo contra a minha vontade? Apenas por ser homem? Com todas essas mulheres que parecem fabricadas em série?

Carlão: Meu senhor, presta atenção. O que você precisa mudar não é a mulher, é o seu comportamento.

Stan: (começando a entender, presta enorme atenção) Sim, sim, explique. Mudar como?

Carlão: Você está escolhendo como um consumidor. Quer algo que atenda a uma necessidade específica. Assim que essa necessidade for sanada, Puft, já era.

Stan: Hum. A grosso modo, entendo. Concordo, até. Como deveria...er...escolher, então?

Carlão: Como um colecionador. Os colecionadores jamais se cansam. Por que os colecionadores não escolhem pela função do produto. Eles não escolhem por precisar de . Eles escolhem pra satisfazer outro tipo de desejo.

Stan: Mas são muito parecidas.

Carlão: Mas não são iguais. Colecionadores têm peças diferentes apenas em pequenos detalhes.

Stan: E no caso de ser a mesma mulher?

Carlão: Nunca é a mesma mulher.(levantando o copo) Caso pense que seja, beba. Um gole a mais, um gole a menos, você tem uma mulher diferente.

Stan: (para Carlão) Ok.Ok. Obrigado de qualquer forma. (voltando-se para Sarah) Me vê uma garrafa de Red Label. E manda um abraço pro Claus, tá bom?

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Um outro conto.


Lá se vai mais um conto. Para os que simpatizam com o Carlão, ei-lo novamente. 
Aos que se identificam com o clássico Cafajeste, como a eterna personagem, alguns dizem que autobiográfica, de Jece Valadão, eis o romantismo de uma classe esquecida e abominada, sobretudo agora, em tempos da crescente e quase opressiva "liberdade feminina".



Sobre o dia em que Carlão morreu.

Chegava eu no trabalho, pontualmente às 08:00, talvez 07:55, quando me dão um aviso estranho. Muito estranho.
- O Carlão chegou cedo. Está te esperando na sua sala.
- Fala sério Selma. Quem morreu?
- A julgar pela cara, algum parente próximo.
Subi as escadarias numa empolgação preocupada. Muito diferente das minhas subidas regulares no mesmo horário. Tanto me empolguei que havia me esquecido de bater o ponto. Retorno, puxo o cartão de ponto, o coloco na máquina e olho o cartão do Carlão. 07:43. Há algo de errado, muito errado.
- Carlão! O que é que há, meu irmão? - Pergunto ao entrar na sala em um rompante.
- Uma merda! Uma merda, só isso. - Me responde ele, com um cigarro apagado no canto da boca.
- Ânimo, rapaz. Quem morreu? - Pergunto esboçando um sorriso nervoso e já temendo a resposta.
- Eu. Assassinado por uma mulher. - responde Carlão, desolado. Isqueiro na mão, mas sem forças e nem decisão para acender o cigarro. - O pior? Fui eu o mandante do crime.
- Porra, esmiuça isso daí, Carlão! Esmiuça.
- Vamos sair daqui. Não quero ser a piadinha suicída do escritório. - Falou Carlão, se levantando e pairando ante mim. Tal e qual o fantasma dele mesmo.

Seguimos para a praça em frente ao trabalho. O cigarro ainda no canto da boca. O filtro já molhado. O isqueiro ainda na mão recalcitrante. Fato, jamais havia visto o Carlão tão moribundo. Lembro que no enterro do próprio pai ele voltou-se pra mim, olhos marejados de choro e cigarro no bico, porém aceso, e disse:
 - Vamos adiantar esse processo. Chore tudo o que você tem pra chorar e vamos sair pra tomar uma. Amacia a alma e o coroa com certeza não ia me querer morto ao lado dele.
Esse era o Carlão. Não esse monte de carne mole que estava à minha frente, de gravata. O Carlão de gravata.

- Escuta. Essa é boa. Você lembra da Clarinha?
- Claro, claro. A que você disse que tava comendo.
- Isso, essa. A assassina. - Falou Carlão, vivo pela primeira vez no dia. E acendeu o cigarro. - Não costumo me envolver com esse tipo de mulher, e não devia ter me envolvido. Digo mais.
- Ah, mas a Clarinha é um doce, o que foi que houve?
- Justamente, porra. Experimente passar um dia inteiro bebendo e depois engolir um doce. Não dá. Desanda. No máximo um ovo de codorna e vá lá. Fiquei um dia com essa cobra. Dois, Três. No quarto dia ela me chamou pra dormir na casa dela. Eu fui. Era o começo da minha desgraça.
- Carlão, essa viadagem toda é porque você se apaixonou?
- Escuta, porra. Não tenta adivinhar. - Retrucou o Carlão, se levantando, definitivamente com vida.
- Tá, tá. Fala. 
- Ao quinto dia, senti algo estranho. Passei o dia querendo que ele terminasse. Mas não pra beber, pra encontrar com ela.
- Que bonito, Carlão. Uma alma por trás de tanta pedra, quem diria. - Falei sorrindo sarcásticamente.
- Alma essa que matamos juntos, presta atenção. Fui pra a casa dela novamente. E nos outros dias. Um casalzinho, uma merda de um casalzinho. Com um mês nesse semi-namoro com ares de casamento eu conheci uma amiga dela. A Juliana. Você conhece ela. Trabalha aqui do lado, na farmácia.
- Ahn? A sexy machine? Aquela que faz o pessoal entrar pra comprar aspirina e sair com remédio pro coração?
- ESSSA, ESSA MESMA!! Amiga de infância, calcula? Logo que ela entrou na casa estava trajando um vestidinho preto, mais colado no corpo do que a própria pele. Me olhou de cima a baixo. Escaneava meu corpo e lia toda essa tal alma que eu estava começando a construir. Tomamos dois ou três drinques e ela finalmente soltou a primeira palavra.
- Cal, tá parecendo que acertou ein. Esse tem cara de homem.
- Que é isso, Jú. Não cobiça o que é meu que é feio. - E riram. Mas risos loucos. Frenéticos. Numa espécie de piada que só elas eram capazes de entender.
- Caramba Carlos Santos, que loucura.
- Você não viu da missa um terço, aguarda. Quando ela saiu, a Clarinha veio pra mim e falou bem assim:
- Linda, né?
- Aham - Disfarcei o quanto pude. - bonita, é verdade.
- Não encosta nela, ein? Eu sei no que você tá pensando.
- O outro dia me foi um inferno. Passei o dia pensando no que ela me disse "eu sei no que você tá pensando". Nem eu sabia. Mas foi no sábado passado que se deu a desgraça. Meio dia, me liga a Clarinha. Me dizendo bem assim:
- Meu anjo, passa na casa da Jú e pega uns DVDS que deixei lá? Faz isso por mim? - E me explicou todo o endereço. Eu não podia dizer que não iria. Claro que fui. Quando cheguei lá, ela estava de shortinho de dormir e blusa de seda...camisolinha, porra, camisolinha.
- Caraca Carlão, que sinuca de bico. - Comentei empolgado com a história. 
- Vê só, tá no começo da merda. Ela me mandou entrar e procurar os dvds. abaixei-me no quarto dela. Isso mesmo, NO QUARTO DELA. e comecei a catar. Sabia os títulos, a Clarinha tinha me dito. Achei os três e quando me virei, prestes a sair, me deparo com a Juliana, deitada na cama de calcinha. SÓ DE CALCINHA. e ela me diz:
- Vem cá, tenho que ver se a Cal escolheu um homem de verdade dessa vez.
- Putaquiupariu Carlão! Que que tú fez?
- Olhei pra a cara dela, agradeci, fingi que nada demais estava acontecendo, virei as costas e fui embora. No outro dia pela manhã, me liga a Clarinha:
- Carlão, preciso te ver.
- Carlão? que que houve com "meu anjo"? - Perguntei sorrindo nervoso. - Peguei teus dvds.
- Estou sabendo, estou sabendo de tudo.
- Escuta, não sei o que ela te disse, mas não é verdade.
- Vem logo, Carlão, deixa de conversa. Aliás, vem não, vamos nos encontrar no barzinho, por favor. No junqueira, em frente ao meu apartamento.
- Lá chegando, ela chorava copiosamente. Um copo de cerveja na mão.
- Bonito, Carlão, bonito pra a minha cara.
- Clarinha, eu nem encostei nela. É tudo mentira.
- Mentira nada. Ela tava de roupinha de dormir e te mandou entrar pro quarto dela.
- Mas amor, eu fui embora, eu fui embora.
- Ela te mandou pegar os filmes, você pegou, demorou procurando. Ela estava de calcinha na cama te esperando.
- Clarinha, eu peguei os Dvds e fui embora.
- Que tipo de homem é você?? Que tipo de homem é você? Acha que é isso que eu quero pra mim? SEU FROUXO.

- Pera, pera, pera. Me perdi em algum lugar, não é possível. - Falei atarantado.
- Perdeu porra nenhuma. Quem se perdeu fui eu. Foi um crime em conjunto, meu amigo. Eu fui o mandante e elas me executaram. Ela levantou e foi embora.
- Caralho, Carlão. Nem sei o que te dizer. Deixa o trabalho de hoje pra lá, vamos tomar umas gelosas. 

Sentamos no bar. Abrimos a primeira cerveja às 08:40 da manhã. Lá pelo meio dia, bêbado, talvez sensibilizado pelas pancadass do fim de semana. Ele vira pra mim e fala:

- Ela nem quis os dvds, porra. Nem quis os dvds.

domingo, 5 de abril de 2009

Pausa para Agradecimentos


 







Bom,  estou oficialmente fazendo uma pausa destinada a agradecimentos, rasgação de seda e puxa-saquismo explícito mesmo.

Brincadeiras à parte, iniciei meu blog há pouco tempo, com a única intenção de não continuar perdendo textos e mais textos, da mesma forma que perdi inúmeros cordéis e poesias que escrevi na minha adolescência e fiquei muito feliz com a repercussão que meus textos acabaram ganhando.

Atualmente o meu blog foi laureado(sempre tive vontade de usar essa palavra) com dois selos, um dado pelo amigo Valdeir e outro pelo Vejablog.

Gostaria de falar um pouco a respeito de cada um deles.


Primeiramente o Selo dado pelo Vejablog, Senti-me muito honrado com a homenagem do amigo Dário Dutra que colocou o meu blog entre blogs e sites premiados no Brasil. Realmente fico sem palavras.

Em segundo lugar, mas obviamente não em grau de importância, fica o meu agradecimento ao amigo Valdeir, que me premiou com o selo "Esse blog é uma jóia". Gostaria antes de mais nada, de me desculpar com o Valdeir, pois não passarei adiante o selo, por assemelhar-se essa atitude a uma corrente de internet e não sou muito afeito a regras e ditames.
Enfim, isso não diminui em nada - até aumenta - a honra que senti em ser laureado(olha a palavra novamente) com esse selo. Aproveito esse espaço e faço minhas as suas palavras em seu mais recente comentário no meu blog: "Também estou feliz em ler seus textos. Há vida inteligente na blogosfera". Há sim e você é prova viva disso, bem como seu blog é prova virtual disso.

Como não vou dar selos a ninguém, gostaria aqui de parabenizar algumas pessoas, pela força e motivação que me deram nesses dias de blogueiro.

Gabriel Pinheiro(nepotismos à parte, bons textos): www.safenacultural.blogspot.com

Jamerson Silva, um grande vencedor que tive a sorte de conhecer nessa vida: www.coisasqueinquietam.blogspot.com

Sheila e seus ensinamentos acerca da psicologia e psicanálise: www.escribadodocio.blogspot.com

Valdeir, grande amigo blogueiro, muitos textos de excelente qualidade e muito conhecimento a respeito da blogosfera: www.ponderantes.blogspot.com

Robledo castro e seus belos e interessantes contos: www.palavrasinformais.blogspot.com
 
A todos outros parceiros da blogosfera cuja memória lenta e ocupada pode me fazer não lembrar dos endereços dos blogs, estão todos aí do lado e sintam-se igualmente homenageados
  --------->

Outras pessaos que eu não poderia deixar de agradecer:

Gustavo Ramalho, afinal de contas se não fosse a ajuda desse webdesigner, não conseguiria mexer em NADA do meu blog: www.s3design.com.br


E por último, não por ser menos importante, mas, em exato contrário, por ser a cereja do bolo, a mais importante de todas Candice, meu amor, a essa eu agradeço por simplesmente TUDO.


Agora, depois de tanta rasgação de seda, prometo um conto, Poema, cordel, crônica...algo assim pra amanhã, ok?

Grande abraço e novamente, MUITO OBRIGADO.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Encontro com a morte.


Bom, conforme vinha prometendo há(corretamente posicionado) algum tempo, segue mais um conto.

O Título originalmente seria "Encontro com a morte", por isso mantive-o no título da postagem, porém à medida que fui escrevendo, mudei para "Duas mortes".

Sem mais delongas, segue o conto. Espero que Gostem.



Duas mortes.

 

 

É quente.
Sinto o calor da mortalha que forra, abafado pelos
10 centímetros de pinho polido acima, abaixo e dos lados.

Não devia estar sentindo isso, mas sinto.

Sinto perfeitamente a movimentação do corpo ao primeiro tranco, resultante do acionamento da manivela que desce o caixão. Sinto a escuridão aumentar a cada palmo percorrido abaixo da terra. Ouço os primeiros punhados de terra jogados pelos parentes, amigos.

Jogados por mim.

 

Meu nome é Sandro Arnaldo Junior. Dr. Sandro Arnaldo Junior.
Neurocirurgião.

O nome, bem como a profissão, herdei do papai. Talento é genético, todos sabem disso.

 

Lembro de uma manhã. Estava com meus amigos, jogando bola. Sonhava em ser jogador de futebol. Diga-se de passagem, jogava muito bem. Meu pai da janela gritava e me chamava:

- Sandrinho! Entra meu filho, você é bom de bola, mas a faculdade de medicina é concorrida, tem que ter uma boa base.

- Ah pai, mas eu quero jogar bola. – Argumentei arfando.

- Como profissão?

- É, pode ser..euheuheuhe – respondi entre risadas e arfadas decorrentes do jogo.

- Mas eu sou o Dr. Sandro Arnaldo, não sou o Zico nem o Pelé.

- Ta booooooom. – Entrei pra casa, desejando no meu intimo ser filho do Pelé ou do Zico.

 

Passados anos de fervoroso estudo, entrei com facilidade na escola de medicina da UFBA, assim como meu pai. Ele era puro orgulho no dia. Ele era pura felicidade. Ele estava uns 20 anos mais novo.
Lembro perfeitamente de quando o Tio Guilherme chegou em casa, charuto na boca, cervejinha em lata na mão

- Parabéns, Sandro. Detonou no Vestibular, ein? – Gritou a todo pulmão.

- Muito obrigado, muito obrigado. – Respondeu meu pai, enquanto eu ainda tomava fôlego para falar.

- Sandrinho, como foi o Vestibular, me conta? – deitando a lata à mesa, perguntou o Tio Guilherme.

- Coisa boba, com todo o estudo, foi fácil. Não foi filhão? – Novamente interrompeu o papai, antes que eu conseguisse responder. Ao que me limitei a assentir com a cabeça.

- Pai, vou sair. Tomar umas com meus amigos, comemorar.

- Vai sim, filhão, vai sim. Ficarei daqui tomando umas também, em comemoração. – Respondeu vigorosamente, enquanto servia um copo de whisky pra ele e um pro meu tio.

 

Aposto que ele ficou mais bêbado do que eu. Quando voltei pra casa, meu pai estava deitado no banquinho do jardim da entrada. O copo na mão derramara em uma possível queda, causada certamente pela embriaguez excessiva. Um cigarro pendia da boca, colado ao queixo, ainda apagado.

Arrastei-o pra dentro de casa, acordei a mamãe que se disse já exausta com toda a cena passada na noite, mas ainda assim deu-lhe um banho de roupa e tudo e o colocou na cama.

 

Era a perfeita imagem de um calouro.

 

A faculdade se passou com velocidade. Tudo era pra mim muito fácil, eu tinha as dicas que precisasse em casa e tinha toda a habilidade no sangue. Legado. Como uma herança. Como se sabe, a herança é algo que geralmente você ganha sem desejar. Algo que só se adquire ante a morte de alguém. De alguém que você ama muito.

 

Anos se passam e agora eu sou Doutor. Doutor Sandro Arnaldo Junior, neurocirurgião.

Dia duro no consultório, abro a porta de casa e encontro a minha mãe – sim, ainda moro com a minha família – aos prantos.

- Sandrinho, o seu pai está muito doente. – Sandrinho...como é bom ser Sandrinho pra alguém. Como é bom não ter um título legado de Dr. Ao menos uma vez.

- Ele ta no quarto, mãe?

- Vai ver ele, meu filho, é o coração, deve ser o coração. Vai, você é médico e vai saber melhor do que eu. – E assim, lá vou eu, novamente Dr. Sandro Arnaldo Junior.

Passo pela porta do quarto e sinto calor e frio ao mesmo tempo. Um temor terrível toma conta de mim. Temor de morte.

- Pai, o senhor está bem? – Pergunto já sabendo de antemão a resposta. Eu podia sentir o frio tomando conta do meu corpo. Podia sentir a dor no meu peito. Não, não estava bem.

- Filho. – Falou ele vacilante. A voz trêmula de quem já não tem tanto tempo. Desgastada. – eu...

 

Ele continuou falando, mas eu já não conseguia ouvir. A dor no peito aumentava. O estômago parecia que ia estourar. A dor aumentava, irradiando-se para o braço, descendo para o estômago. Tudo fica branco. Turvo e branco. Lesão tecidual isquêmica irreversível.

Ouço o ranger da madeira polida em atrito com as pequenas pedras e o cimento. Ouço o som dos esforços abafados dos parentes, gemidos e arfares ecoando no próprio peito ao levantarem a pesada tampa de cimento. Nesse momento, me vem à cabeça as palavras do meu pai. Aquelas mesmas que eu perdi no momento em que minha respiração ficava mais curta e a pressão do meu peito se transformava
em dor. Quando a náusea tomava conta do meu estômago empachado, ele dizia: - Eu já não me preocupo mais com a morte. Criei meu filho. Formei meu filho, você. Dr. Sandro Arnaldo Junior, neurocirurgião. Quero que você fique com meu consultório, com meus aparelhos, até com meus pacientes. A morte já não me causa medo algum.

 

Mas a mim causa. Sinto a escuridão se tornar plena. Colocam a tampa de cimento. Eu coloco a tampa de cimento. Abaixo dela, Sandrinho. Sepultado com todos os seus sonhos, com a sua bola. Acima dela, Dr. Sandro Arnaldo. Embora Junior, Neurocirurgião.

Ângelo Pinheiro



Qualquer semelhança com pessoas reais - ou surreais - pode ser mera coincidência ou não.